Precisamos compreender o desenvolvimento humano, as fases do desenvolvimento infantil e o mundo singular do autismo, para termos acesso às práticas recomendadas de acordo com a fase em que o sujeito se encontra. O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) é entendido como um transtorno de neurodesenvolvimento (autismo), portanto, acomete o desenvolvimento das estruturas neurológicas, mentais e comportamentais. Cada fase e cada comportamento possuem significados distintos.
Após o diagnóstico clínico e as indicações de tratamento, as avaliações dos níveis de funcionalidade são consideradas importantes para complementar, ou até mesmo validar o diagnóstico, mas principalmente, para fundamentar as intervenções necessárias. Saber quem é a criança, como vive, o que gosta, como sente, como compreende, como aprende é fundamental para saber lidar com ela.
Nesta edição do Minuano Saúde, a neuropsicopedagoga Maria da Graça Gonçalves Cunha Neves, especialista em neuropsicologia, explica as linhas de compreensão.
Linhas de compreensão do Transtorno do Espectro Autista
Maria da Graça destaca que existem diferentes linhas de compreensão do TEA: as que enfatizam os aspectos comportamentais como prioritários, a partir da manifestação externa; e as que enfatizam os aspectos comportamentais também como prioritários, mas que partem de uma “leitura” subjetiva, além da manifestação externa.
A especialista diz que o mais importante é perceber a pessoa detrás do diagnóstico ou dos tratamentos. Conhecer suas possibilidades, construir pontes, analisar caminhos. “Apresentar uma visão sistêmica, ecológica de suas possibilidades. Perceber os momentos e situações de intervenção e de mediação. Compreender os processos mentais, compreender as “rotas de acesso e alternativas”, compreender o que os “comportamentos nos indicam”, menciona.
É necessária a observação de pais, professores, cuidadores e pediatras para o diagnóstico e para o devido encaminhamento para intervenção e atendimento. As avaliações são importantes para a análise de perfil e planejamento das intervenções necessárias e o melhor manejo das situações.
Como dica aos professores, em que pese a importância do diagnóstico clínico, é fundamental organizar o diagnóstico pedagógico, ou seja, a avaliação do perfil, da história do sujeito e dos sujeitos da história da criança, áreas de interesse, comportamentos, desenvolvimento e funcionalidade da criança com autismo. Estes itens serão fundamentais para o planejamento das intervenções. É necessário compreender os aspectos principais sobre o desenvolvimento humano.
Para entender o funcionamento cerebral humano, suas aprendizagens e comportamentos, é preciso abordar uma perspectiva no desenvolvimento, que enfoca as fases do ciclo vital. O desenvolvimento humano é um processo que se estende continuamente ao longo da vida, em diferentes domínios, biológico, psicossocial, cognitivo, emocional e lógico-matemático. Todos importantes e que sofrem influências de múltiplos fatores, nos diferentes momentos do desenvolvimento.
O conceito de desenvolvimento humano nasceu definido como um processo de ampliação das escolhas das pessoas para que elas tenham capacidades e oportunidades para serem aquilo que desejam ser. O ser humano percorre diferentes fases em desenvolvimento. É fundamental entender profundamente os processos de desenvolvimento, os marcos significativos, os conceitos envolvidos, para compreender o percurso da criança, suas dificuldades, possibilidades, necessidades das famílias, professores e contextos.
Em via de regra, a avaliação especializada do desenvolvimento compreende as áreas motora, adaptativa, social, linguagem e neurocognitiva. Com relação às funções cognitivas e aprendizagem, são avaliadas as áreas de percepção, atenção, linguagem, memória e funções executivas. Os domínios analisados incluem interação social, comunicação verbal e não verbal, comportamento repetitivo e interesses reduzidos, processamento sensorial, funções cognitivas.
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Como sugestões de práticas para pais e professores, cabe analisar e ponderar se o comportamento indica autismo:
Birra ou crise? Estrutura ou desestrutura?
Rotina imutável ou não?
Se é comportamento comum às crianças ou só com pessoas com TEA?
Como é a família e seus comportamentos para além do TEA?
Está inserida numa organização pedagógica em escola e sala inclusiva ou está em escola comum ou está em escola especial?
E as demais crianças da sala como são como se comportam?
Aprender é fazer sentido, então o que faz sentido para a pessoa TEA?
Quais as rotas alternativas de trabalho e intervenção?
Ainda assim é necessário:
Percepção cuidadosa dos fatores causadores do comportamento, situações, estímulos, pessoas envolvidas;
Deslizamento nos atos e situações de descompensação;
Garantia dos objetos, pessoas e situações que lhe dão segurança;
Ampliação dos instrumentos e estratégias de ação;
Perceber que atua a partir de referências, de ações que a tranquiliza e estimula.
Na escola é necessário um professor referência e sempre que necessário um tutor;
Ter um colega parceiro, que o ajude é muito importante;
Deslizamento (deslizar sua atenção de um foco perigoso ou não apropriado, para outro que chame sua atenção, sem forçar ou retirar nada de suas mãos a força);
Diferenciar mediação e intervenção, criando situações para ambas;
Utilizar meios de simulação, brincadeiras, histórias, vivências a partir do que é significativo.
Construir redes de apoio com profissionais especializados e todos que trabalham e convivem com o sujeito com TEA.
E a importância das famílias?
As redes de apoio, informais e formais, são importantes na promoção da qualidade de vida de pais de filhos. Uma das formas de promover a qualidade de vida no seio familiar é desenvolver uma abordagem centrada na família. É fundamental atribuir às famílias o papel principal neste processo. Família, escola, profissionais, comunidade precisam se constituir como rede de apoio. A pessoa como centro de um sistema, de um todo, não repartida, fatiada, mas inteira, onde tudo e todos interferem e são interferidos.