Manifestantes exigem segurança, participação ativa e reparação justa para comunidades afetadas por barragens e mudanças climáticas em todo o Brasil.
No próximo 5de setembro, instituído como Dia da Amazônia, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) vai realizar atos, ocupações e assembleias em todo o país em defesa da proteção dos direitos de comunidades afetadas pelas barragens e pelo atual modelo econômico, que promove a destruição da biodiversidade brasileira, contribuindo para a intensificação dos extremos climáticos.
De acordo com o Movimento, os atingidos por barragens têm sido vítimas não só da operação de grandes empreendimentos que violam sistematicamente os direitos das comunidades em que atuam, mas também da impunidade destas empresas – nos casos dos crimes ambientais como o do Rio Doce, em que os atingidos aguardam reparação há quase uma década.
Além disso, os efeitos das mudanças climáticas causadas pela degradação ambiental, tornam seus territórios ainda mais vulneráveis. É o caso das secas extremas, queimadas e cheias devastadoras que deterioram a renda, a saúde e a dignidade da população em todo o país.
Segundo a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), empreender medidas de adaptação para proteger suas populações dos extremos climáticos é uma questão central para os países que precisam combater as desigualdades sociais em todo o mundo. Esta foi a principal conclusão das audiências públicas que ocorreram em Bridgetown (em Barbados), Brasília e Manaus no último mês de maio.
Neste contexto, o MAB defende como uma das medidas de proteção da população a imediata implementação da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB) e sua correta regulamentação, com a constituição de um fundo nacional para disponibilizar recursos financeiros para atendimento das comunidades atingidas por barragens e pelas mudanças do clima.
Integrante da coordenação do MAB, Gilberto Cervinski explica que o objetivo do MAB é lutar pela responsabilização dos setores que têm causado a destruição da paisagem de comunidades rurais e bairros periféricos e avançar na reconstrução do país a partir de um novo modelo de desenvolvimento, com garantias sociais e proteção dos atingidos. “Defendemos que é tempo de avançar para defender a natureza, em especial as florestas, e defender a vida e os direitos dos atingidos e atingidas do Brasil. É tempo de avançar também para denunciar os principais responsáveis pelas mudanças climáticas em nosso país. Os patrões da indústria e os grandes proprietários agrícolas lideram a destruição do meio ambiente e afetam o clima com grandes emissões de gases e venenos”, destaca o dirigente.
No setor de energia, Gilberto explica que, para além da degradação ambiental promovida pelos empreendimentos, é preciso denunciar as tarifas abusivas, apagões e baixa qualidade do serviço a partir da privatização do setor que afeta não só as comunidades onde as hidrelétricas são instaladas, mas toda a população brasileira. Por isso, a jornada de lutas terá um caráter nacional, com mobilizações especiais nos territórios mais atingidos pelas barragens e mudanças climáticas.
Seca na Amazônia
A baixa nos rios da Amazônia desde o mês de julho indica que a seca deste ano pode ser pior do que a de 2023. Somente no Amazonas, a previsão da Defesa Civil do estado é que 150 mil famílias sejam atingidas neste ano. As consequências da estiagem, porém, já afetam comunidades em outros estados da região norte: rios estão secando por completo, florestas estão em chamas e comunidades atingidas inteiras estão ficando isoladas e sem água para beber. Importante destacar que na região da Amazônia vivem cerca de 40 milhões de pessoas.
Todos os municípios do Acre já decretaram situação de emergência e Rondônia situação de escassez hídrica, enquanto os rios Negro e Solimões no Amazonas atingem níveis críticos de vazante. O aumento dos focos de incêndio é outra consequência do menor volume de chuvas na região.
Segundo o Painel de Queimadas do Governo do Amazonas, até 19 de junho foram registrados 539 focos – um aumento de 140% em relação ao mesmo período de 2023. Por isso, desde o mês de junho, o MAB vem realizando uma série de articulações com órgãos públicos para discutir ações de enfrentamento à estiagem e combate às queimadas, assistência às famílias em situação de vulnerabilidade.
“É preciso avançar imediatamente para que o Estado brasileiro e os governos (federal, estaduais e municipais) destinem recursos públicos e forte apoio às populações atingidas”, afirma Gilberto. Entre as medidas necessárias para proteger a população da região, o Movimento destaca a imediata distribuição de água potável e alimentos, auxílio emergencial, remédios e atendimento de saúde.
Justiça para a Bacia do Rio Doce – MG
Em Minas Gerais, atingidos vão às ruas durante a Jornada denunciar os rumos das negociações sobre o acordo de reparação ao crime socioambiental cometido pelas mineradoras Samarco (Vale e BHP Billiton). Nos últimos meses, o Movimento tem protestado contra o sistemático rebaixamento dos valores propostos pelas empresas criminosas para reparar um dos maiores crimes sociais do país, que segue causando imensos prejuízos econômicos e sociais à população.
Inicialmente, o governo federal estimou a reparação em R$126 bilhões e, após as recusas das empresas em quitarem o valor, apresentou uma nova proposta orçada em R$109 bilhões. Em resposta, as mineradoras propuseram um montante real de R$ 82 bilhões, parcelados em 20 anos.
“Não podemos permitir que o acordo siga sendo rebaixado e que as negociações avancem sem participação popular. Os atingidos desconhecem os detalhes sobre os programas em que estes valores serão aplicados, como será a participação da população na gestão dos recursos, qual será a divisão dos valores entre os governos e quais os critérios de acesso. Mais uma vez, são as empresas criminosas que ditam os rumos do processo, enquanto as vítimas ficam fora das decisões”, denuncia o MAB em documento já entregue ao Tribunal Regional Federal da 6º Região (TRF-6), que sedia a mesa de negociação sobre o acordo.
Reconstrução do Rio Grande do Sul
No caso das cheias do Rio Grande do Sul, que deixaram 2,3 milhões de pessoas atingidos, o MAB tem atuado no apoio às vítimas desde o início da tragédia, através das cozinhas solidárias em todo o estado. A principal reivindicação do Movimento no contexto atual é aceleração da reconstrução das moradias destruídas. Ao todo, cerca de 112.000 casas foram atingidas em todos os municípios do estado. Mais de 10.000 residências ficaram completamente devastadas pela força das águas em bairros que praticamente desapareceram após as enchentes. Por isso, os atingidos precisam não apenas de unidades habitacionais, mas de reassentamentos com moradias novas, adequadas e seguras, espaços comunitários e estruturas coletivas como escolas, hospitais e creches. No caso das casas danificadas, o MAB defende que o Governo Federal autorize que os próprios moradores reformem suas residências com apoio financeiro do governo, sem interferência de construtoras.
Além da garantia de moradia digna, o MAB reivindica a modernização do sistema anti-enchentes de Porto Alegre e a manutenção de medidas emergenciais para as populações atingidas, como as cozinhas solidárias, a distribuição de cestas de alimentos, o auxílio emergencial, a isenção das tarifas de água e luz, a limpeza das ruas e córregos e a reconstrução dos espaços de saúde pública, entre outros.
Já estão confirmados atos no dia 5 de setembro nas capitais Belo Horizonte (MG), Rio de Janeiro (RJ), Belém (PA), Porto Velho (RO) e Porto Alegre (RS).