A obstrução da votação de projetos importantes da área econômica na Câmara acabou colocando em lados opostos dois aliados da agenda de reformas e do ajuste fiscal: os presidentes da própria Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Pressionado pela paralisação das votações pelos partidos que compõem a base de apoio do governo, Maia se irritou quando o presidente do BC telefonou para ele na quarta-feira, 25 de outubro, mesmo dia em que o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve a Selic em 2% ao ano – para alertar sobre o impacto que a demora das votações estava causando no mercado financeiro – e que teria exigido a intervenção do BC no câmbio para segurar a escalada do dólar.
O BC manteve a taxa básica de juros no menor patamar da sua história, mas não subiu o tom no comunicado divulgado ao mercado, numa postura classificada por analistas como de “morde de leve e assopra depois”. Ou seja, o BC alertou que a inflação piorou, puxada principalmente pelo preços dos alimentos, mas ponderou que o movimento seria temporário, que as projeções ainda estão significativamente abaixo da meta e que o regime fiscal de teto de gastos (a regra que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação) está mantido.
A conversa de Campos Neto, causou desconforto ao presidente da Câmara porque, na sua avaliação, o problema está no governo que não cobraria dos seus líderes o fim da obstrução, que ameaça a confiança na retomada em 2021 e na trajetória de sustentabilidade da dívida pública – que se aproxima de 100% do Produto Interno Bruto (PIB), patamar considerado elevado para países emergentes.
Maia desferiu palavras duras ao presidente do BC depois de ter publicado tuíte acusando Campos Neto de vazar a conversa entre os dois. Para ele, Campos Neto tentou fazer uma articulação política, sem combinar, o que não seria papel dele, mas dos ministros da Economia, Paulo Guedes, e de articulação política, Luiz Eduardo Ramos.
“Não posso deixar mais que esse pessoal fique me expondo. Me colocam em matéria que a culpa não é minha”, reclamou o presidente da Câmara. Maia disse para Campos Neto cobrar da base do governo, que está obstruindo a pauta. “Não venham reclamar de mim, não”, desabafou. Em seguida, o presidente do BC ligou para Maia na busca de uma trégua para evitar mais turbulência no mercado. A resposta de Maia veio logo depois com uma mensagem, também em rede social, dizendo que confiava no presidente do BC.